quinta-feira, 13 de maio de 2010

Porto Épico

São quatro horas da madrugada de um dia limpo de outono. No largo de S. Domingos, no Porto, cá estamos nós, aquecidos por uma “bomba” cuidadosamente preparada pelo Sr. Alexandre, dono da confeitaria da zona. Ao cimo da Rua das Flores avança devagar, mas decidido e firme, o nosso “Mestre”. Recordo o combinado. Sem saber muito bem como nem porquê, havíamos decidido filmar o Porto. Mas o Porto... como? Para quê?
Exactamente no momento do primeiro raio de sol, o Coro dos Realizadores da Escola de Cinema do Porto, asseguram deitados nas areias frias e molhadas do Areinho de Oliveira do Douro a primeira imagem. Perdão: o primeiro magnífico quadro cinematográfico. Câmara fixa plano completamente aberto, sai de cena quem não é de cena... claquete...acção. Atenção ao tempo do plano... quando devo parar? Agora? Ainda não... Agora! Não, não... Agora! Porra isto ainda não desligou... O botão que pára é este. O.k! Já está. “Mestre! Estou todo molhado!” – Grito. “Na alma?” – pergunta o mestre. “Não, nas calças e na camisa!”.
Partimos na direcção da foz do Rio Douro. Havíamos decidido acompanhar o sol no seu percurso elíptico, agarrados às suas mãos subindo até á serra do pilar aonde, exactamente ao meio dia, ponto mais alto do sol, ponto mais alto do Porto, filmamos o 5º canto, a quinta cena, o quinto quadro cinematográfico. Começara a sentir-me bem. Muito bem mesmo. Olho o Mestre. Aquele Homem propõem-me a liberdade, propõem-me agir de forma leve e descomprometida. Fala-me do corpo e da alma. O corpo leva porrada. Quanto mais melhor. A alma vai-se soltando á medida que o corpo morre, ou pelo menos ficando cansado. Exactamente ao pôr-do-sol, filma-mos na Afurada, o decimo quadro.
Porto Épico. Um filme em dez cantos. Mas porquê, para quê? A razão é tolhida. Não há razão para o filme. Nem tem que haver. Viva a magia dos números!
Viva o dez! Vivam os dez cantos! Vivam os dez magníficos quadros cinematográficos. Viva o monólogo!  

1 comentário:

  1. Nunca mais se esqueçem momentos como este, despidos de qualquer técnica ou preconceito.

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